sábado, 17 de novembro de 2018

Dance Comigo

 



É inevitável!
Quando fechamos os olhos e ouvimos o som da música, aos poucos o corpo começa a se movimentar, sentindo a necessidade intrínseca de acompanhar aquela vibração, de entrar em harmonia com o som, de corresponder aos sentidos. É a linguagem do corpo que, em poesia e completude, simplesmente dança...
A dança é mais uma expressão da alma, que faz do corpo a própria pena nas mãos de um poeta. Inspirado e embalado pela música, o dançarino deixa-se levar, entregando-se e entregando movimentos que, literalmente, materializam o som.
Naquela noite, apesar da exaustão física que o dia lhe causara, ele conseguiu sentir leveza, abandonando todo cansaço tão logo pisou no salão. Apresentou-se à dama e aconchegou seus corpos. Todo vigor que usava na mão direita para conduzir a moça, era transformado em doçura na mão esquerda, entregue solícita para o pouso daquela mão de fada...
Mãos, olhos, lábios, corpo e trejeitos de fada, ele diria!
Ah, dama linda que surgiu naquela noite, enchendo de graça os olhos do moço que a conduzia nobre, em gestos rítmicos!
Poesia pura em estado de mulher!
Corpo dançante entregue ao compasso da música, descompassava sutilmente o coração de seu cavalheiro!
A interação das almas parecia pintar um quadro de Rembrandt, arte em movimento...
Ah, momento mágico este, que só a dança permite viver! Troca de olhares, gestos, sorrisos, passos e sentidos. Cumplicidade de emoções que não deveria se encerrar ao final da música, quando o casal se cumprimenta, se elogia e se despede...

Enquanto observa a dama retirar-se do salão, ele cisma com seus botões, embalado por um som diferente, daqueles que só a alma pode ouvir. Aquele som gostoso, que vem de encanto e desejo inesperados, sentimentos que embriagam e entorpecem os sentidos e convidam a uma dança diferente, dança que se dança sem dançar, assim posto.
Imbuído de desejo, ele lança um último olhar e ela sorri acenando, quando ouve as palavras que seus olhos pronunciavam:

_ Dance comigo...

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Amor Próprio


 


É, meu amigo!


Ela foi embora e, sinto dizer... você vai sofrer um bocado! As noites parecerão eternas, a cama duplicará de tamanho como que num passe de mágica. Por algum tempo você não vai conseguir pensar em outra coisa, a não ser nela. A prosa com os amigos na sexta à noite, naquele barzinho de sempre, não será a mesma. A graça acabou. Ela não estará em casa te esperando...

Os anos que viveram juntos virão como raios em suas lembranças. Você vai se lembrar de momentos que havia esquecido há tempos. Vai dar valor àquele sms que recebeu enquanto estava no trabalho, onde ela dizia que estava com saudades. Sim... aquele sms que você mostrou aos amigos e todos riram, comentando como as mulheres são ridiculamente sensíveis. Hoje quando seu celular dá algum sinal, você só deseja que seja um sms parecido com aquele...

O almoço de domingo na casa da sogra, do qual você tentava escapar vez ou outra! Ah! Maldito seja esse macarrão instantâneo que você agora come, quase que por instinto, sentado no sofá da sala...

É, meu amigo!

Agora não há o que fazer...

Ela tentou avisar, tentou conversar, mas você não levou a sério. Afinal, as mulheres sempre reclamam por coisas fúteis!

Pode até ser que um dia ela queira voltar. Mas não será por pena. Sua postura de vítima, como se não conseguisse viver sem a presença dela, só vai fazer com que ela se afaste. Esse nunca foi o tipo de homem que ela desejou e você bem sabe disso!

Portanto, não há o que fazer... conselhos são inúteis nessas horas. Você vai sofrer, vai chorar, vai chegar a pensar que a vida não tem mais sentido. A barba vai crescer, você vai perder alguns quilos e não vai acreditar quando seus amigos disserem que tudo isto vai passar...

Os dias passam, os meses passam... e você começa a notar como seus amigos são felizes, como as pessoas parecem felizes, menos você. Você vai perceber que pessoas vêm e vão. Que você não é o único no mundo que vive aquela situação. Vai se envergonhar por ter sentido pena de si mesmo, isso deveria ser crime inafiançável! Então a dor vai diminuir no peito, você voltará a enxergar beleza nas coisas, onde tudo parecia cinza. Vai se vestir melhor, vai sentir necessidade de conhecer pessoas novas, de se envolver em novas atividades. Você voltará a viver! Demore o tempo que for, esse dia sempre chega: o dia que você começa a praticar o amor-próprio...

Por isso não me peça conselhos agora, meu amigo! Eles não servirão de nada neste momento. A única coisa que posso lhe dizer é:

“Sabe essa dor insuportável? Você vai suportar...”

sexta-feira, 22 de junho de 2018

Agora




 Perdia-se em momentos de outrora.

A penúria assistida lhe causara um ligeiro desconforto emocional.
A ignorância vestida de ternura beija a face dos miseráveis, afaga-lhes a tormenta, transforma a dor em um não viver.
E só...
Pois que o sofrimento existe quando é conhecida sua dualidade.
Ora bolas!
Se apenas ele existe, é justamente nesse momento que ele deixará de existir.
E ele (não mais um cético da existência de verdadeiros zumbis), recompôs-se.
Aceitou o vinho, jogou papo pro ar, apaixonou-se pela vida mais uma vez.
E, mais uma vez, brindou a vida e suas dádivas...

Observou os calafates trabalhando noite alta enquanto percorria a orla no caminho de volta.
Fez dessa observação uma equiparação.
Tomou um banho, um copo d´água, teceu uma prece, fez-se uma promessa.
Nada de cumpri-la amanhã ou depois de amanhã...
Nada de protelar o bem viver.
Porque a vida não é feita de depois.
Ela nunca é vivida no minuto seguinte.
Nunca mais será vivida no minuto que passou.
Existe apenas um momento para se viver.
Agora...

sexta-feira, 27 de abril de 2018

Receita de Pão de Queijo




 Cozinhar é uma das minhas paixões. Aquele momento mágico onde as mãos misturam temperos, combinam sabores, cheiros e cores... ah! Cozinhar é uma alquimia e eu sou um boticário apaixonado!



Como bom mineiro, nos meus tempos de nordeste vez ou outra recebia os amigos em casa com pães de queijo fresquinhos, feitos por mim (se vocês imaginaram aquelas cópias do dito cujo que são vendidas em lojas de conveniência e supermercados, embaladas, congeladas... esqueçam). Eu gosto de cozinhar! Eu boto a mão na massa, esfrego o queijo no ralador...

Uma vez, enquanto preparava a quitanda para um casal de amigos de Salvador, liguei o som da cozinha e ouvi a voz de Humberto Gessinger saindo cantante dos auto-falantes:

“Corrida pra vender cigarro. Cigarro pra vender remédio. Remédio pra curar a tosse. Tossir, cuspir, jogar pra fora...”

Comecei a cantar sua canção enquanto separava os ovos, leite, óleo, polvilho, queijo curado, sal... de volta ao momento mágico do boticário apaixonado!

Enquanto cozinhava e cantava, pensava em como a maioria dos seres humanos estava perdida, tentando acompanhar o ritmo desenfreado da vida que era imposto pela sociedade moderna. Se querem conquistar um lugar ao sol, devem passar uma vida inteira estudando e outra vida inteira trabalhando. Diploma universitário? Que nada... se quiser fazer um pouco de diferença, trate de, no mínimo, terminar uma pós.

“É... vida dura e corrida!” penso eu, enquanto começo a enrolar as massinhas da quitanda pacientemente, cantarolando.

Essa vida não me pegou. Eu tenho tempo pro cafezinho com o cliente, eu gosto de assuntar despreocupado, eu gosto do amor demorado, eu canto mil canções quando o carro não pode seguir adiante por causa do congestionamento. Eu gosto de admirar as estrelas que sobrevivem à fumaça que as grandes indústrias das metrópoles lançam ao céu, que nem dragões! Eu gosto dessa vida assim, mesmo que jamais consiga comprar aquele carro importado pelo qual fiquei admirado ao ver nos reclames, mesmo que não venha a morar naquele condomínio de luxo que anunciaram no jornal de domingo... 

É, amigos! Eu gosto de fazer as coisas que gosto e detesto nissim miojo...

"Quem são eles? Quem eles pensam que são?” tiro os pãezinhos de queijo do forno. Quentinhos, dourados... 

Para a maioria das pessoas que não pode perder uma horinha preparando uma delícia assim, segue a receita:

Vá ao supermercado mais próximo e compre um pacote de pães de queijo congelados. É mais rápido e bem mais prático de se fazer. Mas... quer saber?

Não tem gosto de música...

sábado, 24 de fevereiro de 2018

Só mais um devaneio




 Não temo intempéries.

Nem temporais.
A calmaria, esta sim, é digna de temor.
É quando as coisas acontecem taciturnas, sem lhes darmos os devidos préstimos.
Neste momento coisas insignificantes podem se transformar em catástrofes, às quais, depois, se lhes dão o nome de "acidentes" (independentemente da causa prima).
Tenho enxergado o mundo assim em meus devaneios.
Uma gripe aqui, uma guerra acolá...
Uma moça morta numa manifestação, um avião que cai...
E o mundo inteiro voltando sua atenção pra direção equivocada...
Até quando?

sábado, 27 de janeiro de 2018

Livre Arbítrio


 


É um sonho, eu sei!

Como eu posso estar aqui sentado na beira da Lua, hora dessas, observando a Terra nascer? Um infinito de silêncio me separa do planeta azulzinho que vem surgindo ao longe, uma bolinha azul, tão pequena!
“Desolação magnífica!” – tenho lido Buzz Aldrin, tenho estudado astronomia, ufologia e afins em demasia. Por isso o sonho. É um sonho, eu sei!
A Terra vai se despontando, pequenina. E linda! E linda! E linda! Mas tão pequena...
E eu aqui, sentado na beira da Lua, observando essa beleza. É um sonho, eu sei!
Respiro fundo. Sinto as estrelas, volto o olhar pra bolinha azul: bilhões de pessoas, de sentimentos, de amores e problemas: um raio de sol me toca – que livre-arbítrio é esse que falam por lá?
Faça o que quiser, dentro de suas limitações!
Daqui eu sinto! E como sinto! Esse livre-arbítrio é como se eu pegasse um passarinho, colocasse na gaiola e dissesse: “Faça o que quiser!”
Que sacanagem meu acordar!
Sonho tão lindo o meu! Tão livre, tão leve, tão absurdo!
De tanto em tanto, enrolo o sonho na gravata e faço dele meu norte, minha quase certeza de tudo. De tanto em tanto, fujo da gaiola e, cheio de sentir, tento acreditar. De tanto em tanto, um dia o alvará vai chegar e, imbuído do que restar (se restar), vou pegar uma carona numa cauda dum cometa...

É um sonho, eu sei!