sexta-feira, 21 de outubro de 2016

Um Ágora Brasileiro


  


Às vezes eu gosto de sentar numa praça e observar as pessoas que passam, junto com o tempo. Confesso que sinto vontade de sair questionando e ensinando, como Sócrates fazia nos ágoras. Mas eu não tenho nada a ensinar. Quando muito, consigo aprender com as pessoas que me ensinam, sem se aperceberem disto.

            Nesta semana eu sentei-me num dos banquinhos da Praça da Assembleia, aqui em Belo Horizonte. Às vezes faço daquele canto meu ágora, onde cismo comigo mesmo, toda sorte de devaneios e inquietudes nas quais navegam meu coração e minha mente.
            No banquinho de madeira logo ao lado do meu, ouvi dois moradores de rua papeando, enquanto produziam algum tipo de artesanato:
            _ Rapaz, ninguém passa fome nesse mundo mais não! Você pode ir pra qualquer capital do Brasil, que se tiver um tiquinho de disposição, descola pelo menos pro rango... fácil, fácil!
            _ Você não viu ontem, mano! Eu tava zerado. Corri ali pra Álvares Cabral e descolei vintão, rapidinho. Em meia hora lavei dois carros! Minha bóia e minha cachaça eu salvei...
            _ A gente tá precisando arrumar é um buraco mais da hora pra entocar, acha não? O negócio ali tá sinistro, irmão!
            _ Que nada, mano! Eu to pensando é em cair no mundão de novo! Essas paradinhas aqui que a gente faz, vende demais no litoral! Bora pro nordeste? Tirar onda com as gringas e tal...
            Eu estava tão mergulhado naquela conversa que demorei pra notar a presença de um senhor, que sentou-se ao meu lado. Roupas simples, óculos de grau, segurava uma mochila no colo quando disse:
            _ Faz frio, faz calor... quem entende esse tempo?
            _ Pois é... só este ano a gripe me pegou duas vezes...
            _ Cheguei aqui cedinho, vim ter com meu chefe ali. Mas disseram que ele vai aparecer só à tarde... vou esperar, não é? Vim de Manhuaçu só pra resolver um problema com ele. Sabe do que estou falando?
            Não, eu não sabia...
            O senhor continuou:
            _ Na hora de pedir voto, vai pra cidade da gente e promete de um a tudo! Eu fiz minha parte, agora eu quero o meu. Sou esperto, menino! Ninguém me faz de bobo não. Dei meu nome pra ele, RG e tudo. Agora eu quero o meu...
            _ Entendi...
            _ Ó, este aqui é irmão deste! ele disse, mostrando os olhos atrás dos óculos de grau._ O assessor disse que ele chega de tarde. Estou só esperando meio-dia. Meio-dia pra mim já é de tarde. Não saio daqui sem o meu. Ah, não saio mesmo...
            É... por essas e por outras, o Brasil ainda é o país do futuro. Passei os olhos pelas páginas de um livro, enquanto ele continuou:
            _ Quer saber? Sou bobo nada! Depois o deputado chega antes do combinado e vai embora sem ter comigo! Sou bobo não! Vou sentar a bunda lá na cadeira da sala dele e não arredo o pé enquanto ele não aparecer. Bom dia aí pra você... sou bobo?
            Não contive o riso, observando seu andar claudicante. No banquinho onde os moradores de rua conversavam, percebi um casal.
            _ Mas olha que coincidência! Tem uns dez anos que a gente não se vê, uai!
            _ Não é mesmo? Eu casei, meu marido já me largou. Agora tô com a minha filha sozinha. Lembra dela? A Bruna. Naquela época ela tinha cinco anos... está uma moça!
            _ Eu passei um bom tempo em São Paulo e voltei. Vida dura lá!
            _ Olhe, estive em São Paulo no Consulado, tentando visto pra Bruna ir pra Disney, mas não consegui não...
            _ Ah, sei! O Netinho é dono lá...
            _ Netinho?
            _ É, aquele cantor de pagode...
            _ Dono de onde?
            _ Do Consulado, uai...
            _ Ah, é? Sabia não...
            Nem eu. Ainda tenho muito que aprender...

Nenhum comentário:

Postar um comentário